domingo, 6 de maio de 2007

Um breve resumo do Bakthin


Da redação do Grupo Terra - Alberto, Angela, Giselle, Berenice, Fabiana e Karina

Bakhtin

Interessa-lhe o que ocorre no diálogo, como em qualquer outro evento de linguagem, em termos de relações dialógicas, entendidas estas como relações semânticas (no sentido que Bakhtin dá ao termo semântica) que se estabelecem entre dois enunciados quaisquer postos em contato. O encontro de enunciados é o encontro de seus respectivos complexos de significação – que envolvem, na concepção bakhtiniana, sentidos sempre saturados por índices sociais de valores. A lógica das relações dialógicas é a defrontação de axiologias.

O termo diálogo, em Bakhtin, é o nome para o simpósio universal que define o existir humano (vd.Estética da criação verbal, p. 348) e não para uma forma específica da interação face-a-face e menos ainda para uma forma composicional do texto.

Como filósofo, Bakhtin se vincula às chamadas filosofias da existência. Onde o pensamento não pode ser indiferente à existência ou dela estar separado. Bakhtin critica o que ele chama de teoreticismo, ou seja, a separação abstrata entre o mundo da cognição e o mundo da vida e defende a necessidade de resgatar a unidade perdida.

O pensamento de Bakhtin é radicalmente histórico (não vivemos num vazio abstrato, mas no concreto do tempo, da cultura, das relações sociais) e hermenêutico (os eventos do existir humano, por serem sempre historicamente únicos, não são inteiramente previsíveis, dedutíveis de grandes estruturas abstratas. Por isso, não são explicáveis por sistemas lógico-matemáticos, conforme ambiciona a tradição racionalista. Só podemos interpretá-los).
Para Bakhtin, nada do que é humano está desvinculado de um universo de valores.

Compreender qualquer evento humano é deslindar, num primeiro momento, o jogo de valores que o organiza. Mas isso não é tudo: a compreensão deve ser sempre responsiva. E responder é posicionar-se valorativamente frente a tal jogo de valores. Nesse sentido, a compreensão não pode ser entendida como uma tautologia ou uma mera duplicação do texto. Quem compreende se torna participante do diálogo donde emergiu o texto e do diálogo que o texto suscita.

Cada ser humano é, na concepção de Bakhtin, único e ocupa um lugar único na existência.

Cada um de nós é efeito da alteridade: nada sou fora das relações com os outros; nós nos constituímos e vivemos nas relações com a alteridade. Ou, nas palavras dele nos apontamentos para a reformulação do livro sobre Dostoievski (Estética da criação verbal, p. 341):
Ser significa conviver. A morte absoluta (o não-ser) é o estado de não ser ouvido, de não ser reconhecido, de não ser lembrado. Ser significa ser para o outro e, através do outro, ser para si. O ser humano não tem um território interior soberano, está todo e sempre na fronteira; olhando para dentro de si ele olha para os olhos de outro ou com os olhos de outro.

Assim, Bakhtin vai dizer que viver é responder, é assumir, a cada momento, uma posição axiológica frente a valores. Viver é participar desse diálogo inconcluso que constitui a vida humana. A dialogia é, portanto, fundante do nosso ser no mundo e da nossa própria consciência.

Vivemos em um mundo de palavras do outro. E toda a nossa vida é uma orientação nesse mundo; é a reação às palavras do outro (uma reação infinitamente diversificada), a começar pela assimilação delas (no processo de domínio inicial do discurso) e terminando na assimilação das riquezas da cultura humana (expressas em palavras ou em outros materiais semióticos). (Estética da criação verbal, p.379)

Nossa cognição é necessariamente historicizada e semioticizada. Assim, nós nunca podemos alcançar uma relação direta e pura (não-mediada) com o mundo; ele sempre é apropriado de forma refratada, isto é, no interior de horizontes sociais de valores.

A concepção sociológica subjacente em Bakhtin é, assim, a de uma sociedade atravessada por conflitos e não uma sociedade saída do contrato e do consenso.

Ser autor é assumir uma posição axiológica frente ao já multiplamente valorado, é assumir um lugar nos embates da heteroglossia dialogizada, é ser dialogicamente ativo, respondendo ao que já está dito. Não se reduzem textos
por mera atualização de potencialidades lingüísticas e/ou textuais.

Como a consciência lingüística é plurivocal e sua atividade verbal depende, a cada vez, de um posicionamento frente à heterogeneidade, o autor do texto não se confunde com a pessoa física que o enuncia, mas é entendido como uma função interna ao texto, como o elemento ordenador da totalidade de sentido do texto.

Para se transformar em autor, a pessoa física tem de assumir uma voz social. A partir dela, construirá seu produto verbal, mobilizando enunciados heterogêneos vindos de diferentes vozes sociais que ressoarão explícita e/ou implicitamente no texto. Vai ordenar esses enunciados e responder a eles das mais diversas maneiras.

Não se pode olhar o texto apenas como um artefato, como uma coisa em si. É preciso pensá-lo fundamentalmente como “obra”, como “texto implícito” ou como objeto estético – termos que podem ser compreendidos com designando o complexo de relações de que o texto participa.

A unidade do texto não é dada primordialmente pela sua forma externa, mas no plano da “obra”, isto é, a unidade é dada pelo amplo e complexo quadro de relações axiológicas que presidem a atividade de produzi-lo (as condições concretas da vida dos textos, suas interdependências e suas interrelações).
É este plano (que em alguns momentos é chamado de forma arquitetônica) que vai governar a construção da massa verbal, do todo do artefato (construção que, em alguns momentos, recebe o nome de forma composicional), inclusive a seleção do material verbal (dos elementos lingüísticos estrito senso).

Um comentário:

angela rodrigues disse...

Nosso grupo de trabalho estuda o jornalismo institucionalizado e nossa escolha recaiu sobre o terra.com, um dos sites mais acessados no país, segundo se comenta. Numa rápida leitura comparativa com os argumentos de Bakhtin/Bruno Leal, o site é um exemplo típico da chamada narrativa digital, devido principalmente à pluralidade de "janelas" e jogos de linguagem, permitindo diferentes debates/embates entre emissores e interlocutores, os Eus e Tus. Valendo destacar o link VC REPORTER, que aparece no meio do texto de várias reportagens, convidando o usuário a enviar fotos e notícias. Eh, pelo que parece, todo mundo pode ser jornalista. Ou não?